quinta-feira, 3 de março de 2016

História: Rei por um dia

Vocês têm que entender, eu esperei por esse dia durante nove anos inteirinhos.
É isso mesmo: vou ser rei, finalmente!
Certo que é por um dia apenas, pois meus pais foram viajar no sábado e voltarão no domingo. Mas quem se importa?
Meu nome é Eduardo: dormirei na sexta-feira como príncipe e, no sábado acordarei rei.
– Só vou fazer o que gosto e nada daquilo que eu não queira.
Era assim que eu pensava e esperava que fosse a vida de um rei, até que o grande dia chegou…
Pulei da cama e não estava com fome, afinal de contas não podia perder tempo com essas coisas, só tinha vinte e quatro horas pela frente e, se for descontar as oito horas de sono, só tenho dezesseis na verdade.
Por causa da minha pressa e ansiedade, não vi a lista que meus pais deixaram ao lado da tigela do cereal, e aí, as coisas começaram a se complicar:

• Primeiro não alimentei o dragão da torre (imaginem a bagunça que faz um dragão com fome)
• Depois deveria cuidar das catapultas automáticas (se elas não têm munição, pegam automaticamente a primeira pedra que encontram por perto e, como estavam ao lado do muro do castelo – que é feito de pedras –, vocês podem imaginar a altura que ele ficou: até um coelho salta por cima agora)
• Por último foi a vez do bobo da corte (como não apareci no show diário, ele se magoou; só chorava e eu tive que contar piadas até que ele se acalmasse)

O tempo não passava, peguei a lista e contei um, dois, três ítens: tudo ok. – Já posso ir passear a cavalo e nadar no rio!
Mas, quando já estava na escada, pronto para descer, o mago me chamou e mandou ir à feira buscar os ingredientes para as suas poções.
Parece que todos – sem exceção – resolveram me dar tarefas pra fazer. – Será que se esqueceram que dia é hoje?
Peguei a lista do magoem cima da sua mesa – e, passei a mão na varinha mágica também: – Vou ficar invisível, assim não me verão e não vão me pedir mais nada. Vou ficar em paz durante o meu dia.
É verdade que eu nunca fui o primeiro aluno nas aulas de Magia, mas eu sabia algumas palavras mágicas. Ah! Isso eu sabia! Mas, devo ter dito alguma coisa a mais ou alguma coisa a menos; o fato é que além de eu ficar invisível, ficou tudo cinza, exatamente quando acabei de falar ARBADACARBA (o contrário de ABRACADABRA, que os magos usam pra fazer aparecer coelhos, pombos e assistentes).
Qualquer iniciante sabe usar essas palavras mágicas e isso nunca poderia ter acontecido: – O que aconteceu com as cores, para onde elas foram?
Agora ao invés de um problema, eu tinha dois. O primeiro é que eu não teria mesmo sossego no meu dia de rei e, o segundo – e pior –, é que eu não teria nem mais reino pra reinar.
– Aonde foram parar as cores? O que eu vou dizer aos meus pais?
Não esperei para ouvir as broncas e os gritos de todo mundo e, se eu não podia pedir ajuda ao nosso mago – que a essa altura devia estar louco da vida comigo –, fui pedir socorro para o mago do castelo vizinho.
Ainda invisível, peguei o cavalo na estrebaria e, só fiquei visível novamente quando já estava bem longe.
Os vizinhos estavam todos coloridos: o apagão foi só no nosso castelo mesmo.
Assim que desci do cavalo, alguma coisa caiu do meu bolso e quando me abaixei pra pegá-la, vi que era o bilhete dos meus pais com a lista de tarefas do dia.
Surpresa! Ele continuava no verso da folha e, surpresa maior ainda, havia uma quarta tarefa:

• Não esqueça de ligar – no quadro de força – o disjuntor que liga as cores do castelo.


Ah!
Voltei correndo ao castelo pra ligá-lo e, fazer as cores voltarem. Ufa, voltaram! E, todos queriam saber aonde eu estava e porque havia sumido de manhã.
Quando contei o que tinha acontecido e que eu havia pensado que fizera as cores sumirem falando algumas palavras mágicas, todos nós rimos muito. Foi realmente muito engraçado, mas na hora levei um baita susto e fiquei supernervoso.
Só então, fiquei sabendo do Sistema Camaleão que o castelo tem pra se defender e assustar os inimigos: ele se transforma em um verdadeiro castelo mal assombrado, com efeitos de relâmpagos, trovões, gemidos, gritos e sons de corrente arrastando e portas rangendo. Se a gente esquece de ligá-lo e desligá-lo regularmente, o disjuntor cai e fica tudo cinza e sem cor! E, eu que pensei que morasse num castelo mal-assombrado de verdade...
Bom, agora que eu já posso relaxar e finalmente aproveitar o meu dia de rei, vou dar a minha primeira ordem: usar esse sistema pras festas de Halloween e incrementar o turismo na região. Vai ser demais!
O mago porém, tinha outras ideias e me jogou uma caixa cheia de garrafas PET, embalagens plásticas e de longa vida vazias: era o dia da reciclagem no castelo e, sim era a quinta tarefa. Isso nunca vai terminar:

• Dar uma oficina de artesanato para as crianças do reino.


Vou aproveitar a oportunidade e fazer – além de vários jogos coletivos – uma fantasia de rei para todos nós nessa oficina: coroa, sapato de armadura e cavalo de montaria. Tudo com material descartável.
Não preciso mais ter um dia só pra ser rei: eu e todas as outras crianças podemos nos vestir e ser rei em qualquer dia da semana.
E pensando bem: ser príncipe por enquanto já está de bom tamanho, pois ser rei dá muito trabalho, não é mesmo?

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