Sou
uma castora, me chamo Aurora, tenho oito anos e tenho certeza de que
irei trabalhar com mordidas em madeira quando crescer: o meu pai é
marceneiro; minha mãe faz brinquedos artesanais de madeira; meu tio
trabalha com molduras de madeira para quadros; o filho dele é perito em
instrumentos musicais feitos com madeira de lei e; a minha tia tem uma
fábrica que só faz quebra-cabeças com madeira também.
Desde que eu
nasci ouço histórias dos meus antecedentes castores que ajudaram – com
as suas mordidas e dentes fortes – a fazerem a Arca de Noé, a Távola
Redonda, o Cavalo de Tróia, a Caixa de Pandora, a Caixa Mágica de serrar
pessoas ao meio, a primeira casa pré-fabricada de madeira, a moldura da
Mona Lisa e o primeiro dique de que se têm notícias.
Não usamos
serrotes, serras elétricas, lixadeiras, tornos, furadeiras,
entalhadeiras e nem plaina: fazemos tudo no dente e é assim que gostamos
de trabalhar.
Meu pai diz que só nós – os castores – temos o poder
de perceber e apreciar a tonalidade, a textura e o cheiro, únicos de
cada tipo de madeira. E para tanto, temos que agarrá-las, mordê-las e
roê-las: é desse jeito que as transformamos em peças maravilhosas.
Adoro os meus dentes de castora: eles são grandes, fortes e tenho muito orgulho de ser uma dentuça.
Porém, quando estava roendo um cedro, um dia desses, meu dente doeu e eu não consegui terminar a escultura que estava fazendo.
Minha mãe falou que a dor ia passar, mas o tempo passou e a dor continuou.
Pensei
que talvez eu tivesse dentes de leite – como os meninos e as meninas –
e que esse fosse ficar mole, cair e depois no lugar cresceria um
novinho em folha.
Escrevi para a Fada dos Dentes para confirmar, mas
ela me respondeu que infelizmente só atendia humanos e nunca tinha
ouvido falar de uma castora sem dentes. No seu estoque não haviam dentes
para castores.
Fui ao dentista e depois de me examinar com a boca
aberta, fechada e dente por dente, ele me deu a notícia de que eu seria a
primeira castora – da família e da história dos castores – a usar um
aparelho: meu dente estava desalinhado e, por isso começou a doer.
Naquele
dia fiquei muito triste: não poderia mais roer e nem morder nada duro,
até tirar o aparelho dentro de seis meses. O que eu faria agora?
Mas,
por outro lado fiz o maior sucesso na família, na vizinhança e na
escola: nunca haviam visto uma castora com aparelho nos dentes e todos
queriam tirar fotos comigo pra postar nas redes sociais.
Foi legal. Comecei até a gostar do tal aparelho.
Mas continuava triste, parecia que faltava algo.
Todos
os meus amigos, vizinhos, colegas e familiares foram muito gentis e
amáveis: me encheram de favores, mimos, mensagens de melhoras e
guloseimas. Foi daí que eu percebi como era grande a nossa família.
Estava acostumada só com os primos, tios e avós, mas descobri que tínhamos parentes em outras cidades, estados e até países.
Não
saía mais da Internet e ficava horas de bate papo no Facebook e no MSN.
Cada dia conhecia um parente novo e ficava encantada com a história de
cada um.
Um mais maluco que o outro: tinha um primo japonês que
morava no Zoológico de Tóquio e era especialista em fazer hashis
(pauzinhos de madeira que são usados pelos japoneses para comer, ao
invés da faca e garfo a que estamos acostumados); outro baiano que só
gosta de roer Pau Brasil; um do Xingu que queria fazer diques no rio
Amazonas; o da África que se especializou em lanças para as tribos
locais e o dos Estados Unidos que fazia tótens para os índios de lá.
Tinha castor de tudo quanto era jeito e que roíam tudo quanto era tipo de madeira. Mas, só madeiras!
A história da nossa família era demais e eu queria fazer parte dela também.
Já
que eu não podia roer madeira, resolvi então que faria parte dela
roendo tudo quanto é tipo de material, menos madeira. Dá pra ser mais
original do que isso? Uma castora que não rói madeira!
E desse dia em diante passei a morder tudo o que encontrava pela frente:
• ferro (não gostei porque é muito duro quando está frio e, muito quente quando amolece);
• gelo (gelado demais);
• tijolo (esfarela na boca)
Estava
difícil substituir a madeira. Até que um dia passando em frente ao
supermercado vi as latas de lixo recicláveis com uma porção de
embalagens vazias. Não custava nada experimentar e dei uma mordida numa
garrafa PET, depois numa bandeja de Isopor e uma roidinha em algumas
caixinhas de papelão.
E, não é que eu gostei? E, o melhor de tudo: não doía o meu dente porque era tudo muito molinho.
Mas, o que fazer com tanto material assim?
Minha
mãe – que é uma artesã supertalentosa – me ajudou e adaptamos tudo o
que ela faz com madeira, para os meus materiais alternativos.
Já tenho até um blog, viu?
Quem
diria, não é mesmo: eu que jurava que iria roer madeira até morrer
estou roendo e reaproveitando material descartável e até ajudando na
defesa do meio ambiente!
Faço de tudo, desde brinquedos individuais até jogos coletivos. Vejam alguns deles e faça-os você também!
Você gosta de ler histórias de aventura e de fazer arte? Aqui você encontra tudo isso. Usaremos material descartável – garrafas pet, bandejas de isopor, caixas de papelão, embalagens e sacolas plásticas –, como matéria prima para a construção de inventos e brinquedos. Enquanto nos divertimos criando e lendo, estamos ajudando a preservar a natureza reutilizando esses materiais.
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