Vou ser monge!
Hoje é o meu primeiro dia de aula com o Mestre Borboleta. Estou indo para a montanha onde ele mora com todos os seus discípulos.
O
Mestre é muito velhinho, cheio de sabedoria e ensina tudo o que sabe
aos mais novos como eu. E, não vejo a hora de começar a estudar,
conhecer meus colegas, fazer novos amigos e virar monge logo.
Eu sou o
primeiro dragão a ser aceito no mosteiro do Mestre Borboleta. Até hoje,
só aceitavam bichinhos pequenos como lagartas, borboletas, aranhas e
outros insetinhos. Mas, eu tenho dez anos, me chamo Nero, tenho dois
metros de altura, peso 100 quilos e estou super-feliz por estudar com o
Mestre.
Já pensei em tudo o que vou fazer quando chegar lá:
• darei uma baforada na caixa d’água e deixarei o ofurô de todos bem quentinho;
• nas noites de festa, vou comer batata-doce com repolho, bater na barriga e soltar fogos de artifício por trás;
• baterei as asas bem rápido pra ventilar os aposentos nas tardes de verão;
•
o meu pescoço comprido vai servir de escorregador para os discípulos
pularem no lago das carpas e os velhinhos não precisarão mais se cansar
andando pelas alamedas e jardins do mosteiro, pois eu os levarei de garupa de um lado pro outro;
• vou assar e grelhar os pratos do almoço e do jantar.
Vou ser um sucesso!
Pra
descontrair e quebrar o gelo vou chegar arrasando: treinei bastante e
entrarei ao som de música eletrônica e passos de hip hop.
Putz, mas
não contava com uma construção tão frágil. Tudo é tão delicado, que
quando cheguei ao portão, o mosteiro todo já tinha caído. Portas,
janelas, paredes e telhado: tudo no chão.
Foi um corre-corre danado:
gente saindo de tudo quanto era lugar e fugindo pra tudo quanto era
lado. Demorou pra perceberem que eu havia chegado e os mais velhos até
pensaram que estavam sendo atacados ou que se tratava de um terremoto.
O
Mestre Borboleta chegou, esclareceu o mal-entendido, todos se acalmaram
mas não conseguiram esconder o mal-humor por terem que reconstruir todo
o mosteiro novamente.
Fiquei com a fama de dragão estabanado que só
dava trabalho e trazia confusão. E, a partir daí, as coisas só pioraram:
as criancinhas choravam quando me viam e eu descobri que não ganharia
nunca a eleição do mais popular se houvesse uma.
Não foi exatamente o
que eu esperava para o primeiro dia de aula, pois todos me evitavam e
as tentativas de me dar bem em qualquer matéria, também não estava dando
muito certo: as aulas de origami pegaram fogo – literalmente – quando
me pediram pra soprar o balão que o Mestre ensinou; e nas aulas de
levitação e ioga, assustei todo mundo quando relaxei tanto, dormi e não
consegui segurar nem o ronco e muito menos o tombo.
As aulas de
culinária não foram diferentes: fazia sashimi numa boa, mas era só abrir
a boca pra tostar, grelhar ou cozinhar qualquer coisa que devia ser
crua. Nunca dava certo. Foi frustrante.
Mas teve um dia – na aula de
jardinagem – em que estávamos cultivando bonsais e criando ikebanas e eu
com as minhas unhas e dentes afiados de dragão, ia cortando e
esculpindo arranjos e dando formas às árvores com uma facilidade
incrível e, todos começaram a pedir que eu os ajudasse. Me animei, tomei
gosto e fiquei descuidado: não olhei onde pisei e dei meia-volta muito
rápido para atender a todos os chamados e assim, o meu rabo bateu na
mesa de arranjos, as ferramentas que estavam ali foram lançadas contra a
torre do relógio e ela caiu em cima da ponte do arco-íris que passava
em cima do lago das hortênsias. Na pressa de consertar as coisas,
coloquei o telhado da torre em cima da ponte, ergui um observatório no
lugar do lago e coloquei uma passarela na sala de chá.
Quando
terminei, estava tudo diferente e o mosteiro nem parecia o mesmo. Fechei
os olhos e esperei a maior bronca, mas – para minha surpresa –, todos
aplaudiram as minhas mudanças! Eles haviam adorado!
Acho que ninguém aguentava mais viver naquele mosteiro milenar sempre e sempre igual, há milhares e milhares de anos.
Fui
tão cumprimentado nesse dia, que não resisti e pulei de alegria. Aí, o
pavilhão do tai-chi-chuan – que ficava atrás –, não resistiu e caiu!
Antes que alguém pudesse reclamar e voltar a implicar comigo, o Mestre Borboleta pegou um tijolo, jogou para mim e disse:
— Vamos reformar esse pavilhão que já está muito pequeno e fora de moda!
Todos
gostaram tanto da ideia de reformar tudo, que foram me dando sugestões
uma atrás da outra: primeiro queriam um puxadinho ao lado de cada
dormitório pra terem uma banheira de hidromassagem no lugar do ofurô;
ar-condicionado e calefação em todos os quartos; esteiras e escadas
rolantes; janelas anti-ruídos e vidros fumês; novos estilos de torres,
muros, telhados e desenhos nos arbustos.
Todos queriam um castelo mais moderno. Queriam que tudo fosse remodelado.
O
Mestre Borboleta – que não esperava tantas mudanças de uma só vez, pois
era o único que ainda gostava de uma tradição milenar – já não sabia
onde estaria o seu quarto no dia seguinte, se na ala norte ou na sul, e
nem onde seriam feitos a meditação e o ritual do chá de todas as manhãs.
O mosteiro e os monges estavam irreconhecíveis.
Mas
– pra preservar um pouquinho da história e deixar o Mestre mais feliz
–, tombaram como Patrimônio da Humanidade a ala oeste do mosteiro – a do
sol poente –, e por isso não podemos mexer ali e, o Mestre Borboleta já
se mudou para lá.
O melhor de tudo é que não preciso mais me
preocupar se os outros gostam – ou não – de mim, pois tenho certeza de
que agora, já aceitam o meu jeito dragão de ser.
Eu descobri, também, o que vim estudar no mosteiro: arquitetura!
Acho que não levo jeito pra monge, mas sem dúvidas levo jeito para demolições e construções.
E
a história não termina por aqui, agora que pedimos delivery (além da
tradicional cozinha japonesa), e somos fãs de um supermercado todo
fim-de-semana, sobra muita embalagem reaproveitável no mosteiro e então,
usamos todo esse excesso de material descartável pra fazer maquetes
antes de reformar!
Já temos até um Teatro e fazemos vários fantoches, dedoches e marionetes também.
Você gosta de ler histórias de aventura e de fazer arte? Aqui você encontra tudo isso. Usaremos material descartável – garrafas pet, bandejas de isopor, caixas de papelão, embalagens e sacolas plásticas –, como matéria prima para a construção de inventos e brinquedos. Enquanto nos divertimos criando e lendo, estamos ajudando a preservar a natureza reutilizando esses materiais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário